domingo, 1 de junho de 2014

DEUS GUARDA MINHA CANÇÃO

DEUS GUARDA MINHA CANÇÃO

Eu existo porque canto.
Nada sei, senão cantar...
Encanto por desencanto
ou canto para encantar.

Tenho a alma das violas
nas danças de desfastio
e beijos de castanholas
nas horas de meu estio...

É acalanto quando calo
como flauta sussurrada
no canto mudo do galo
que perdeu a alvorada...

É mudez do vasto espanto
de ver tanto amanhecer...
Não é mágoa nem é pranto
mas o encanto de nascer.

Eu trago memórias fartas
das almas dos bandolins
das guitarras e das harpas
dos corais dos querubins...

Não é magia nem fado
o louvor que me conduz
pelas veredas do prado
dos rebanhos de Jesus...

Afonso Estebanez

ÁTIMO

ÁTIMO

Só com você
preciso tanto
de navegar
que tanto mar
(entre nós dois)
é um caminho
que não precisa
de chegar...

Só com você
é tão eterno
estar amando
que ser feliz
(entre nós dois)
é um momento
que sempre acaba
atrapalhando...

Se não é sonho, naufraga!
Então, estamos sonhando...

Afonso Estebanez

AMANTES DA ALDEIA

AMANTES DA ALDEIA

Eles tinham cabelos brancos
do amor que dói e não passa
e a lembrança dos encontros
por entre os jardins da praça...

Fecundavam-se entre beijos
e entre abraços numa dança
encobrindo entre os desejos
velhos segredos da infância...

Eram como almas agrestes
das aves férteis de outonos...
E se amavam nos ciprestes
dos silvestres cinamomos...

Ah!... os amantes da aldeia
são de quando o amor doía...
E quando morria um deles,
ah, o outro também morria...

Afonso Estebanez

FLOR DA ALMA

FLOR DA ALMA

Vem desse amor eterno de você
uma canção tangida pelo vento
uma flauta no som do pensamento
que ressoa na alma e não se vê...

Brisa da tarde nos florais do ipê
num cântico de beijos ao relento...
Um feitiço de amor à flor do tempo
que vem sem precisar dizer porquê...

Uma canção de ser tão docemente
percebida... Tão leve se pressente
que a gente nem precisa perceber...

Basta ao amor plural de sua vida
saber-se a alma eterna e resumida
na alma de uma flor no alvorecer...

Afonso Estebanez
(Poema dedicado a Geisa Gonzaga
Comunidade “Devaneios de Poeta”-DF)

POEMA TENTADO

POEMA TENTADO

Houve um tempo em que eu escrevia versos
como quem tinha a certeza de que o poema
era possível...
Mas agora eu componho versos como quem 
já não tem certeza alguma de que o poema
é impossível...

Houve tempo em que eu só falava de amor
por quem só tinha a certeza de que o amor
era possível...
Mas agora eu só falo por amor como quem
não firma certeza nenhuma de que o amor
é impossível...

Meus poemas eram como as pontes curtas
lançadas sobre os rios mais largos da vida.
Era tudo iniciativa...

Escrevia um poema para matar a saudade
que era a minha legítima defesa putativa.
O que parecia ser um poema de verdade,
era apenas tentativa...

Afonso Estebanez

POEMA MELANCÓLICO

POEMA MELANCÓLICO

Não fora a vida imensurável desafio,
viver só por viver não valeria a pena
eis é preciso ouvir e ver passar o rio
entoando com a solidão da lua cheia
uma canção amena.

É necessário reinventar cada jardim
e ver o reflorir que tem a primavera
um se redefinir como princípio e fim
e o que, de súbito, no cio da manhã
se vê pela janela.

Gasto dias sob os arco-íris da garoa
liberado de mágoas em decantação
eis é preciso retornar a quem entoa
esta canção de paz e de melancolia
no vasto coração.

Quantas vezes perdi o último navio,
e vi o cais vazio, o que vivi desfeito.
Mas a despeito desse cântico tardio
meu coração por desafio ainda vive
cantando no meu peito.

Afonso Estebanez