domingo, 2 de março de 2014

“HENDECASSILABITÁLICO”

Trata-se de produção ao estilo contraposto às formas rígidas do soneto petrarqueano com versos de onze sílabas métricas, único verso designado por ‘Arte Maior’ usado pelos poetas do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende. Segundo Jacinto Prado Coelho, em seu Dicionário de Literatura, "No Cancioneiro Geral de Resende, onde triunfa a redondilha, só se encontra um verso de arte maior. Trata-se de um ritmo especial, cuja voga se limitou ao século XV, mas que ainda se encontra em Gil Vicente (séculos XVI), composto de versos de dez e onze sílabas". Sua designação, na prática, incluía todos os versos com mais de sete sílabas. Mas os poetas do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende utilizaram exclusivamente, como verso de arte maior, o de onze sílabas, pelo que esta designação acabou por se referir exclusivamente ao verso hendecassilábico, que se veio depois a tornar raro na poesia portuguesa..." Com o triunfo renascentista do verso decassílabo italiano, usado abusivamente por Francesco Petrarca (século XIV) e moderadamente por Camões (século XVII), o verso de onze sílabas caiu em desuso. O exemplo contestatório que estamos oferecendo como mote rítmico flexível do último verso dos quartetos e tercetos do soneto “HENDECASSILABITÁLICO”: – "E moyr'eu, Senhor, por me d'eles partir" – constitui uma glosa em português arcaico em contraposição ao latim ‘volgare’ ao engessamento do soneto praticado pelo ‘Senhor dos Sonetos’ (Petrarca) tipo exportação. O hendecassilabitálico que lançamos é um cântico lírico (o que era inadmissível no soneto decassílabo da escola petrarqueana) composto supostamente por um cavaleiro templário sobrevivente dos campos de batalha (os campos de batalha da vida) que regressa suplicando o direito à paz e à liberdade, em nome do bem comum maior atribuível ao ser humano: o amor. No soneto “hendecassilabitálico” que compus, dei nítida preferência a que a cadência, a tonicidade interna e a sonoridade recaíssem sobre as 2ª, 5ª, 8ª e 11ª sílabas de cada verso. Afonso Estebanez Stael.

NUMEROSO AMOR

NUMEROSO AMOR

Ah, numeroso amor de que padeço
que me conta mistérios sobre mim...
Ô, enigma! princípio sem começo
destino que termina e não tem fim...

Amor que apraz e dói! amor avesso
que assim se exaure e se refaz assim
morrendo de viver por quem mereço
na volúpia de crer que é amor afim...

Flor de lótus de deuses consagrados
nos desígnios dos bem-aventurados
de alma pronta na vida já completa.

É deusa quem me dá o dom divino
de confirmar nas cartas do destino
o carisma do amor que me liberta...

Afonso Estebanez
(Soneto dedicado a Maria Madalena Cigarán Schuck )– moderadora das comunidades “Confrarias Poéticas I e II” e responsável pela divulgação de minha poesia no sul do país)



MEU LOBO

MEU LOBO

Meu lobo é essa ausência conspirada
na alcova de minha alma aprisionada
nos escombros de um vasto anoitecer.

O pasmo é que esta noite a liberdade
fez-me gritar mais alto que a saudade
da qual você nem mesmo quis saber.

Eu só sei que meu grito foi de espanto
desta saudade acuada em cada canto
de não sei onde ou como nem porque.

Só sei que foi um grito e tão profundo
que se ouvia no mais além do mundo
meu lobo uivar da ausência de você...

Afonso Estebanez