sexta-feira, 4 de novembro de 2016

VISÕES DE ALCOVA

Que nossas vidas não sejam
entregá-las – mas perdê-las
nas poças sujas dos charcos
em que habitam as estrelas.

Sou o quanto é meu desejo 
que à ninguém dei remover 
feito um quarto de despejo
que em si coube sem caber. 

Mortalhas de nossas almas
sudários de pranto e dores 
nossas noites têm a calma
dessas veredas sem flores.

Sem louvor a expectativas
de quem sofre falso e-mail
por quem flores primitivas
nascem pedras de centeio. 

Confiscar mágoas sem dor
é o meu jeito de vivermos:
celebrando o próprio amor
com amor pelos enfermos.

Afonso Estebanez
(Composição dedicada ao notável poeta e escritor 
Josias Alcântara – membro da Academia Brasileira
de Poesia e autor de “A Magia da Expressão Verbal” 
– v. Comentário in Vitrine Literária da ABP) 
HAIKAIS


HAIKAIS


HAIKAIS


HAIKAIS


O VERDE VALE DA MINHA CIDADE


É o ribeirão exausto procurando
no remansoso coração da tarde
silenciar-se de chegar cantando
ao verde vale da minha cidade...

Pernoita a lua atenta no telhado
das casas onde tênue claridade
revela o amor em pelo revelado
no verde vale da minha cidade...

A saudade se dói de andar à toa
no lado vago de minha saudade
de ver o trem sumindo na garoa
do verde vale da minha cidade...

Ha canteiros de rosas e jacintos
no caminho da vaga eternidade
da orla dos ribeiros não extintos
no verde vale da minha cidade...

A paz daqui é como eterno bem
para quem vive com a liberdade
de já não precisar de nada além
do verde vale da minha cidade...

Afonso Estebanez
(Dedicado à eminente professora cantagalense
Anabelle Loivos Considera C. Sangenis/UFRJ) 
Não vou desistir


Eu não vou
desistir do amor
nem da paz
nem das rosas
nem dos sonhos
nem de ti
e nem Deus
vai desistir
de mim...

Mesmo assim
haverá
mais espinhos
de plantão
do que flores
no jardim...

Pois o resto
é a razão
de ser assim...

Afonso Estebanez 
O ÚLTIMO DIA DE TRABALHO
DO PÔR-DO-SOL NO MAR
(OU DO PENOSO OFÍCIO DE SONHAR)


Havia o mar na sombra do horizonte
havia o pôr-do-sol na água sombria
havia o porto e a encosta do mirante
e os corpos dos amantes na mortalha
da água fria...

Havia as naus no dorso dos destinos
e a brisa que saudava a volta ao cais
com os corais dos cantos peregrinos
das harpas e violinos dos noturnos
vendavais...

Havia como um repousar do mundo
nos profundos jardins das enseadas
havia vasta ausência no mais fundo
das almas insepultas que sonhavam
acordadas...

Havia o céu de estrelas rutilantes
e havia o mar de ninfas reluzentes
e a corrente de espumas flutuantes
das errantes escunas entre luzes
fluorescentes...


Agora onde era o mar há o oceano
o poente sem sonhos naufragados...
Jaz agora no cais em ritmado sono
o pertencido amor dos navegantes
afogados...



Ainda há aves mortas no convés
e há naves ancoradas sem destino
o declínio de auroras dispersadas
pelas marés da saudade em pleno
desatino...

Ficou uma canção de marinheiro
e um canto rústico de pescadores
o pôr-do-sol no doloroso encanto
de renascer, sonhar, depois morrer
sem dores...

Afonso Estebanez
(Poema vencedor do I Concurso de Literatura do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região – TRT-Rio), com premiação em obras literárias famosas oferecidas pela Academia Brasileira de Letras (ABL). Comissão julgadora: Pedro Garcia, poeta, educador, doutor em Antropologia, professor da Universidade Católica de Petrópolis, Maria de Lourdes Soares, professora-adjunta de Literatura Portuguesa e Literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestra e doutora em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), e Vera Lúcia de Souza Lima, professora-adjunta de Literatura Brasileira da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, mestra em Letras pela PUC-Rio, doutora em Letras pela UFRJ, professora da Secretaria de Cultura do Estado Rio de Janeiro e autora de ensaios publicados na área de literatura e leitura. Presidente do TRT-1ª Região: Desembargadora Doris Castro Neves.