quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

QUARTA ROSA DE SAROM

QUARTA ROSA DE SAROM

QUARTA ROSA DE SAROM

Porque eu exalto o amor de minhas rosas
o amor por minha amada exulta em mim.
Porque malgrado as flores mais formosas
só a minha rosa é eterna em meu jardim.

Pois que o louvor do gamo às venturosas
servas chega em meus vales num clarim,
trago assim das vertentes mais rochosas
minhas rosas com ungüentos de alecrim.

Hoje eu sei me encontrar sem me perder
morrendo em teus caminhos sem morrer
porquanto és minha amada e pertencida.

Que eu te pertenço como um sonho vivo
pertence aos sonhos que me dão motivo
para que eu morra em mim por tua vida.

Afonso Estebanez

sábado, 17 de janeiro de 2009

TERCEIRA ROSA DE SAROM

TERCEIRA ROSA DE SAROM

TERCEIRA ROSA DE SAROM

TERCEIRA ROSA DE SAROM


É doce quanto o sonho de ser procurado
meu sonho mesmo tardo de te procurar.
É eterno como o fado de ser encontrado
sob o peso do fardo de não te encontrar.

O evangelho das rosas me traz revelado
que o mistério do amor é o único pomar
onde uma lágrima é um fruto maturado
que flui da alma da saudade de te amar.

Meu coração ainda é recâmara de amor
e tâmaras entre os racimos de ternuras
que te ofereço pelo amor além do mito.

Ô, toda rosa amada! aflito é o desamor
que não revive de saber das amarguras
que o limite da minha rosa é o infinito...


Afonso Estebanez

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

AMOR DE CORPO INTEIRO

AMOR DE CORPO INTEIRO

AMOR DE CORPO INTEIRO

Desejo teu amor de corpo inteiro
o amor da lua cheia sobre o mar
de alfazemas no cio campineiro
da sementeira
prenhe do luar...

Navegar é o ofício do barqueiro
dos mares do desejo de te amar
conhecer os segredos do roteiro
por onde o amor
precisa navegar...

Aceito o amor servil do cativeiro
das virgens medievais para adorar
nas alcovas profanas do mosteiro
ao sacro ritual
sobre um altar...

Professo o amor fiel do romanceiro
que em teu ventre me faça cavalgar
tal como um confidente cavaleiro
cavalga estrelas
para te encontrar...

Por teu amor meu anjo mensageiro
vem de um tempo remoto te buscar
e proclamar meu lado companheiro
de te fazer amor
para sonhar...

Quero fazer amor de corpo inteiro
exaurir-me em teus braços e pensar
que ainda sou teu ultimo e primeiro
amor que padeceu
para te amar...

A. Estebanez

PERDÃO DE AMOR

PERDÃO DE AMOR

PERDÃO DE AMOR

Passo noites bordando com retalhos
pedaços dos momentos de ternuras
com que fiz das estradas os atalhos
perdidos entre estrelas de venturas.

Não sei o que falar dos espantalhos
que falaram de mim essas loucuras
de caminhar no céu entre cascalhos
por amor e prazeres de aventuras...

Jamais pensei que dor doesse tanto
de amor e que de mero desencanto
padecesse de espinhos minha flor...

Levo culpas, mas não resta culpada
minh’alma por princípio inocentada
perante um justo tribunal de amor!

A. Estebanez

MOTIVO

MOTIVO

MOTIVO

Preciso morrer hoje
como o perfume extinto
na tragédia da flor.

Morrer profundamente
como o sol que agoniza
no leito do crepúsculo.

Quero apenas o tempo
de rever a saudade
na lágrima do orvalho.

Depois voar na brisa
gangorrear no vento
entre sons de clarins...

A. Estebanez

MYSTEREY

MYSTERY

MYSTERY

Como a noite no encontro vagaroso
com o dia nas fímbrias do horizonte
vem teu sentido ao ímpeto amoroso
de me tomar a mim por teu amante.

Porém não sei haver tão venturoso
destino que me mate e desencante
desse amor feiticeiro e olhar ditoso
de um gozo que me faz agonizante...

Amar é abismo oculto numa estrada
pois que mistérios de princípio e fim
o que nem mesmo Deus deve saber...

Da alcova de minh’alma apaixonada
meus olhos dizem coisas sobre mim
que meus lábios jamais podem dizer...

A. Estebanez
(Homenagem Especial a Raul de Leoni
– Academia Brasileira de Poesia)

NAMORADA

NAMORADA

NAMORADA

A minha namorada
é como a luz da aurora.
Quase nunca retarda
quando o dia precisa
e a noite é indecisa
e a alvorada tem hora...

Quase sempre ela dia
quase nunca ela é noite
quase nunca ela é tarde...
O amor dela é remido
sem a dor dos sentidos
é um amor sem alarde...

A. Estebanez

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

SEGUNDA ROSA DE SAROM

SEGUNDA ROSA DE SAROM

SEGUNDA ROSA DE SAROM


Já contei muitas vidas de braços abertos
inaugurando na alma as tuas primaveras
revividas nas flores dos jardins desertos
onde te resto como lírios entre as heras.

Aqui estou apascentando os teus afetos
como pastor do sol no vale das esperas
onde conduzo rosas em jardins abertos
a claros vales verdejantes de quimeras.

Rosas são páginas escritas de carinhos
registradas nas pétalas pelos espinhos
do meu secreto descaminho da paixão.

E rosas vivem pelo dom da eternidade
das minhas rosas no finito da saudade
onde repousa a rosa do meu coração.


Afonso Estebanez

PRIMEIRA ROSA DE DELOS

PRIMEIRA ROSA DE SAROM

PRIMEIRA ROSA DE SAROM


Tão triste é tu encontrares um amor
tão triste que não pode te encontrar
tão vasto como o aroma de uma flor
dispersa na lembrança sem lembrar.

Oh, fonte de água viva! banha a dor
do tédio do deserto e a joga ao mar
onde o pranto supõe ser um louvor
ou o meu canto ao direito de chorar.

Chorar por toda rosa é uma canção
que dói, mas não magoa o coração,
se meu amar é vida e amor é dom.

Eu quero apenas encontrar a rosa:
entre muitas aquela mais formosa
reflorida entre as rosas de Sarom!


Afonso Estebanez

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

POEMA TENTADO


POEMA TENTADO

Houve um tempo em que eu escrevia versos
como quem tinha a certeza de que o poema
era possível...
Mas agora eu componho versos como quem
já não tem certeza alguma de que o poema
é impossível...

Houve tempo em que eu só falava de amor
por quem só tinha a certeza de que o amor
era possível...
Mas agora eu só falo por amor como quem
não firma certeza nenhuma de que o amor
é impossível...

Meus poemas eram como as pontes curtas
lançadas sobre os rios mais largos da vida.
Era tudo iniciativa...

Escrevia um poema para matar a saudade
que era a minha legítima defesa putativa.
O que parecia ser um poema de verdade,
era apenas tentativa...


Afonso Estebanez

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

LUCIRANDA


LUCIRANDA

Entre o olhar e a palavra
algo fala e reluz
num caminho sem curvas
de algum raio de luz...

Como risos da areia
derramada no vento
som de chuva na água
num cantar sem lamento...

Vago instante da aragem
em que a relva soluça
à procura do lado
em que a flor se debruça...

Leve cheiro de orvalho
canto de ave no cio
flor e flauta em murmúrio
no remanso do rio...

Afonso Estebanez

LISA


LISA

Nos ciprestes quem dança
é a toada perdida
se é o vento quem canta
e quem chora é a brisa.

Chuva fina no rosto
e entre musgo escorrida
nas penugens do corpo
descoberto de Lisa...

No lençol de alvo linho
uma rosa imprimida
em sudário de cio
sob lua precisa.

Da janela do quarto
ouço vaga cantiga
de algum anjo em compasso
com os passos de Lisa.

E na rua quem vaga
é a flauta partida
da canção acabada
na toada indecisa...

Nos ciprestes quem mora
é a flauta perdida
se é o vento quem chora
e quem canta é a brisa...

Afonso Estebanez

LINHA CRUZADA


LINHA CRUZADA

Postes telegráficos
esses cactos das caatingas
calados sem se calar...
Mas adonde estão os fios?
Por acaso deus se esconde
ou finge que não responde
preces pelo celular?

Se eu morresse amanhã
de saudade eu gritaria
e ninguém comentaria
se nem deus vai escutar...

De saudade vou morrer
e nem deus vai comentar...

Afonso Estebanez

LA CUISINE EN FLEUR


LA CUISINE EN FLEUR

Pega as rosas do ciúme
e os espinhos do jardim
e os refoga no perfume
dos ramitos de alecrim...

Coração ao fogo brando
para a alma me aquecer
vai em breve refogando
meus desejos de viver...

Espera chegar ao ponto
em que a liga dê prazer
onde tudo seja encanto
pelo encanto de viver...

E de noite à luz da vela
em cada prato uma flor
eu tomo dos lábios dela
um sobrebeijo de amor...

Afonso Estebanez

JUDAS


JUDAS

Os que venderam a fórmula
da bomba e da talidomida
mataram mais do que Judas
com o beijo da traição.

O Mestre expiou-se na forca,
mas os discípulos, não!

Os mercadores de armas
os caçadores de índios...
Todos renegam a forca.
Os sadânicos satãs
os fratricidas armados
os algozes travestidos
de juízes da multidão...

Todos mataram mais cristos
do que o mestre vendilhão...
Mas se passam naturalmente
por Judas – o bom ladrão!

Afonso Estebanez

INTIMIDADE


INTIMIDADE

Não foi, amada!
Não foi o orvalho
da madrugada...
Foi a lua na janela
que te surpreendeu
dormindo e chorou
desconsolada...

Afonso Estebanez

INTERMEZZO


INTERMEZZO

A oficina do amor é o coração.
Quando se consumar a profecia
já não precisarão mais do profeta.
Quando se consumar a poesia
já não precisarão mais do poeta...

Por isso devo reinventar o amor
antes de reinventar a minha vida...

Vou conversar apenas com as flores
falar somente em bem-aventurança
calar-me para sempre como a alma
sepultada no fundo da esperança...

Eterno como a noite sobre a pedra
na história da canção despercebida...
Como o silêncio sábio da memória
das coisas simples
não compreendidas...

Afonso Estebanez

EPITÁFIO - I


EPITÁFIO - I

Guardei banais segredos dos amores de criança
dos mistérios da infância ouvi apenas por tolice
contei parábolas de amor porque o próprio amor
predisse que na vida viveria só dessa lembrança
de reviver das cinzas de uma flor do apocalipse...

Afonso Estebanez

EPITÁFIO - II


EPITÁFIO - II

E das águas correntes desse rio em minhas veias
de onde doce fluísse uma canção jamais ouvida...
Talvez de alguma fonte de desejos clandestinos
ou dos prazeres matutinos de profanas ladainhas
dos arcanjos decaídos de meus sonhos suicidas...

Afonso Estebanez

EPITÁFIO - III


EPITÁFIO - III

Apraz-me então morrer dos místicos presságios
de quem padece lentamente da secreta liturgia
de reencontrar-me pelo acaso de um momento
em que a parte encantada de mim fosse a magia
desse feitiço de poder-me amar além do tempo...

Afonso Estebanez

EPITÁFIO - IV


EPITÁFIO - IV

E era tudo o que a alma não defesa pretendia...
E para muito além do que muito além de mim
onde jaz meu pássaro cantor de súbito abatido
concebido me fosse então morrer de desamor
se reviver de amor a mim não fora concebido...

Afonso Estebanez

HÁBITO ADQUIRIDO


HÁBITO ADQUIRIDO

Meus dias têm o hábito
de caminhar pela alameda sem dar conta de mim.
Um hábito que as tardes me ensinaram generosamente.
Os bolsos cheios de nada e as mãos vazias de tudo...
De volta, o portão de casa entreabre os braços secos
e me convida para entrar...

E vem aquela sensação de que esqueci
de me lembrar do que o dia indiferente não contou...
Retorno em busca da lembrança do sorriso de amizade,
do cântico de um pássaro, de um beijo que me deu a brisa...
E só então percebo que minhas mãos vadias
– não sabendo uma o que a outra anda fazendo –
já me haviam tocado o coração secretamente
com o encanto que as idas e vindas pela vida
acabavam de me dar...

Entro afinal, e num cantinho da memória
um sorriso de criança acende a luz
da minha alma...

Como se alguma flor esquecida
estivesse me estendendo a mão...
... a mão do aroma de rosas
que ainda me acompanha...

Afonso Estebanez