sábado, 12 de novembro de 2016

ELEGIA PARA MEU AMOR 

A manhã me deu em brisa
a brisa me deu em quanto
deu-me a tu’alma indecisa 
os sonhos do teu encanto.

O dia deu-me em ventoso
e a tarde deu-me chuvosa
a noite nos deu num gozo
como o pólen deu na rosa.

E a vida me deu em parte
tudo o que em parte ficou
pelo amor que me reparte
entre as partes que levou.

Tudo aqui dá em saudade
como a saudade do vento
que me excita a liberdade
de viver em pensamento.

Afonso Estebanez
VERSOS TERNURENTOS

Quero mesmo é desembarcar no instante
de perplexidade da alvorada ao deflagrar 
de teu sorriso em meus campos beirados 
de alfazemas...

Abrir suavemente as portas dos sentidos
como quem abre os lençóis dos arco-íris
e se deixa embriagar num cálice infinito
de poemas...

Como quem ouve histórias de venturas
escritas na penúltima página do fôlego
da alma extremada de ternuras e versos
amorentos...

Como quem toma do pomar de outonos
as flores sazonadas e os maduros pomos
da brisa rarefeita de abraços e de beijos
ternurentos...

Afonso Estebanez
(Poema dedicado a Sônia Maria Grillo 
– “Baby” – Consul de Poetas Del Mundo
no Espírito Santo) 
POEMA MELANCÓLICO

Não fora a vida imensurável desafio,
viver só por viver não valeria a pena
eis é preciso ouvir e ver passar o rio
entoando com a solidão da lua cheia
uma canção amena.

É necessário reinventar cada jardim
e ver o reflorir que tem a primavera 
um se redefinir como princípio e fim
e o que, de súbito, no cio da manhã
se vê pela janela. 

Gasto dias sob os arco-íris da garoa 
liberado de mágoas em decantação
eis é preciso retornar a quem entoa
esta canção de paz e de melancolia 
no vasto coração. 

Quantas vezes perdi o último navio, 
e vi o cais vazio, o que vivi desfeito.
Mas a despeito desse cântico tardio
meu coração por desafio ainda vive
cantando no meu peito.

Afonso Estebanez
DOCE ASFIXIA DE AMOR

Ah, se te houvesse padecer o quanto
do tanto que esse amor desesperado
padeceu-me de enfado e desencanto
como um beijo nos lábios sepultado. 

Ah, se me houvesse redimir o pranto
do tanto que te amei sem ter amado
em padecendo em ti morrendo tanto
como o canto de um pássaro calado.

O amor que me asfixia de esperança
também se cala e em ti retine mudo
como sino a tanger sem ressonância.

Ah, não te fora o místico ‘contudo’...
Eu perdoaria o ‘mas’ da intolerância.
E meu amor, sem ‘mas’, seria tudo! 

Afonso Estebanez
(Dedicado a Maria Magali de Oliveira
– fiel companheira de jornada) 
DOCES ANOS DE VIDA...
Já vivi por muitos anos 
e deles levo a saudade 
da lira dos desenganos 
que ficou na mocidade.

Se tive idílios profanos 
foram só da suavidade
dos romances levianos
vividos na minha idade. 

Da vida, levo a cantiga 
que reviu a minha vida
reescrita só por prazer.

Ao prazer da afinidade
que vive só da metade 
da vontade de viver... 

Afonso Estebanez 
(Soneto dedicado à ilustre poetisa gaúcha 
Vany Campos, pelos seus noventa anos
completados em 22/02/2015). 
AMOR DE PRIMAVERA

O amor como a primavera 
é um estado de vida urgente 
que não deve ser esperado
como chuva de verão... 
Não, amor, não deve não! 

É necessário levantar bem cedo 
(enquanto a aurora dorme ainda) 
e partir à procura do amor
nas lonjuras do coração...
Antes que chegue o verão! 

Bom levar a vida bêbada
num traçado de brisa ao ponto
que ao sonho a alma se junta...
Antes que seja tão tarde
e ao amor pareça nunca! 

Afonso Estebanez
(Dedicado à poetisa Sônia Medeiros Imamura)
DE ALMA NO VENTO...

Ainda que seja só em pensamento
não me procurem onde não estou.
Eu não fiquei no cântico do vento,
pois a canção do tempo me levou. 

Talvez meu coração tão desatento
não tenha percebido o que passou.
Ainda que seja só em pensamento
não me procurem onde não estou.

Eu não estou num doce desalento
por amor tão sonhado que passou.
E nem estou num agridoce alento 
de sonhar o que o sonho recusou.

Não me procurem onde não estou
ainda que seja só em pensamento.
Morre o corpo num resto que ficou
de minha alma levada pelo vento.

Afonso Estebanez – 28.04.2009
(Dedicado a Maria Madalena Cigarán Schuck 
– pelo seu aniversário – pleito de gratidão pela 
divulgação de minha poesia no sul do país) 
BURACO NEGRO

Ser meu amor e amante
ser volúpias de meu ser
ser o lado mais distante
de meus lados de viver.

Ser o morto ainda vivo
e estar vivo sem querer
o querer morrer cativo
sem ser preciso morrer.

Ser operários sem lida
os contrários do galope
no vão do meio da vida
ou na beirada da morte.

Buraco negro do amor
sem nenhum alvorecer
como a flor a flor a flor
de Hiroshima renascer.

Ser esse fundo do poço
um chão seco de jardim
até que o meu alvoroço
não suporte nem a mim...

Afonso Estebanez 
PORTA DE SONHOS

Fiz uma porta de sonhos
com duas partes viradas 
para as portas do jardim 
os dias foram tamanhos
e de todos fiz os sonhos 
que vivi dentro de mim...

Naquelas partes viradas
para as rosas do jardim
inventei uma esperança
de viver de quase nada
e minha vida inventada
do nada restou assim...

A alma nua e penitente
com a calma da manhã
e a memória do jardim
no sonho da primavera
convivendo de quimera
as duas partes de mim...

Afonso Estebanez
(Dedicado à minha generosa amiga
Silvana Filgueiras R. de Castro Reis) 
PÁGINA ABERTA

Amanhã eu vou embora
mas sabes que vou ficar
como parte da memória
que não consigo apagar.

É a magia é como o viço
do vício da brisa e o mar
é a cantiga de um feitiço
que não deixo de cantar.

Amanhã tu vais embora
mas eu sei que vais ficar
como página da história
que jamais pude fechar.

Afonso Estebanez
DA ESPERA DESESPERADA

Penso em deixar o coração aberto
para quando tu vieres me buscar.
Nada em meu peito ficará deserto
enquanto o coração puder cantar.

Meu pássaro cantor virá por certo
como o vento cantando no pomar
anunciando no sonho já desperto
o dia certo em que tu irás chegar.

Enquanto tu és apenas esperança
eu vivo de saudade da lembrança
de morrer do desígnio de sonhar:

que teu amor é doce destempero
de meu amor de paz e desespero
do que morri de tanto te esperar.

Afonso Estebanez
AMANHÃ DE MANHÃ...

Eu te darei meu infinito
em que deixes no meu grito
uma cantiga tão pura
que pareça mais ternura
do que o teu amor aflito...

E eu te desejo corpo aberto
como o céu sobre o deserto
de meu sonho mais contrito...

Como se fosse uma agonia
ou uma simples sinfonia
de teu amor dormindo
em mim...
 
Como uma rosa enlunada
da minha parte plantada
na beira do teu
jardim... 

Afonso Estebanez
SORRISO DE MULHER
Há sorrisos que são
muralhas de palavras
represadas por um
tratado de mordaça
que inibe o amor com
as linguodentais da trava
da liberdade simples
de sorrir por graça...

Mas teu sorriso como
a luz das alvas conchas
abraçadas no suave
encontro das marés
é algo como os lírios
puros em que encontras
as rosas brancas entre
os lábios da mulher...

Afonso Estebanez
(Dedicado a Sonia Regina de Souza Braulio
– Poeta *Soninha BB* no mundo literário)
VEREDA DE ROSAS...

Só uma rosa púrpura me vem na aurora
dos tempos revividos na vereda em flor...
Na alameda de rosas dos jardins de agora
a rosa púrpura é o dom da luz do amor...

Que oportunos seriam todos os instantes
nos livres roseirais de púrpura dos anos
se ainda verdejasse a alma dos amantes
nos canteiros insípidos dos desenganos...

Que diria meu tempo às horas indecisas
do amor-perfeito já maduro do primeiro 
o atento jardineiro às flores imprecisas
as sempre-vivas ao fascínio do canteiro...

Essas rosas vermelhas da paixão no cio
mergulhos de corais no seio da mulher...
E tudo o que me quer das rosas é tardio
meu lado triste de baldio bem-me-quer...

Acácia branca de jardins imperecíveis
Flor de lótus na luz das rosas orientais...
No azul etéreo desses seres intangíveis 
leva-me a brisa no cantar dos roseirais...

Oh, doce rosa púrpura no ser profundo!
Dom da alma se sabe a ser e não se vê...
Toda rosa pode nascer rosa no mundo
mas só uma no mundo pode ser você!


Afonso Estebanez
(Poema dedicado à Débora Malucelli -
Comunidade “Poemas & Cia”)