segunda-feira, 13 de março de 2017

A MAGIA DA EXPRESSÃO LITERÁRIA
OFICINA – MODULAÇÃO INTERATIVA – 11
* UM PINGO DE “OS SERTÕES” *



UM PINGO DE “OS SERTÕES” – Mais do que um meticuloso resumo de autoria da notável professora, poetisa e escritora cantagalense Ruth Farah Nacif Lutterback, Um Pingo de “Os Sertões” supera a expectativa autoral de que o conteúdo desta obra significasse apenas mais uma vertente didática na introdução ao estudo de “Os Sertões” – essa inestimável herança cultural que o cantagalense *Euclydes Rodrigues Pimenta da Cunha legou à humanidade. Não se trata apenas de um “pingo” literário nos mares estagnados da literatura do pré-modernismo brasileiro. Porém, em se tratando de Euclides da Cunha, a iniciativa da professora Ruth Farah se transforma em ‘atitude-denúncia’ dotada de eficácia bastante a aumentar o volume do oceano cultural que banha os espaços continentais alcançados pela obra do autor de “Os Sertões”.

Estão aqui preservados a ordem do itinerário – A Terra, O Homem e A Luta – e a denúncia social, política, jornalística e antropológica dos contrastes culturais entre os dois “brasis” cruelmente revelados: o do sertão e o do litoral. Ruth Farah lança luzes sobre a crítica ao nacionalismo exacerbado da população litorânea que, cega para a realidade da sociedade mestiça produzida pelo deserto, agiu com ferocidade criminosa contra a própria raça: a autora chama a atenção sobre o grande tema de “Os Sertões” e sobre o tom crítico com que se analisa o que séculos de atraso e miséria são capazes de produzir em regiões geográfica e temporalmente separadas do resto do país – lideranças fanáticas, delírios coletivos e inconformismos sociais.

A intenção de Ruth Farah até poderia ter sido a de trazer a lume – numa síntese possível e fiel aos aplausos dos estudiosos – o somatório dos três elementos fundamentais da tragédia nacional que, jornalisticamente relatada por Euclides da Cunha nas páginas de “Os Sertões”, ainda hoje haveria de levar a consciência da sociedade brasileira ao patíbulo do tribunal de julgamento da História, por crime coletivo contra a humanidade. Aos nossos olhos, Ruth Farah o conseguiu ao expor, com transparência e evidente conhecimento de causa, os fatos, os importantes questionamentos e as grandes formulações sociológicas, antropológicas, históricas e políticas, para que compreendamos, com espírito mais crítico, o país de antes e de depois da República, segundo os embriões sócio-políticos revelados por Euclides através do processo de DENÚNCIA contra a realidade brasileira, então ainda deitada no berço esplêndido do romantismo decadente.

Da síntese da autora extrai-se ainda o que a partir de 1902 (publicação de “Os Sertões”) tornar-se-ia evidente na literatura brasileira, como os traços e condições reais do sertanejo, o ‘jagunço’, o ‘cangaceiro’, a ‘sub-raça’ do nordeste brasileiro: o herói determinista que resiste à tragédia de seu destino fatalista e irreversível.
É inevitável a constatação de que “Os Sertões” é uma das obras-primas da literatura brasileira. Como repórter de O Estado de São Paulo, Euclides da Cunha testemunhou a Campanha de Canudos, uma luta sangrenta contra os fanáticos que, chefiados por Antônio Conselheiro, ‘ameaçavam’ a segurança das povoações vizinhas. Mas em “Os Sertões”, admiráveis foram os estudos da terra e do homem do sertão nordestino, de suas ATITUDES na demonstração da capacidade de resistência.

A exposição de Ruth Farah deixa claro que “Os Sertões” foram uma obra que até hoje incomoda. Provoca e instiga. Estimula a pesquisa, a investigação da verdade, as reações contra o conformismo, as idéias de renovação de valores, os questionamentos político-sociais e a busca de soluções.

Estamos, assim, diante de um Euclides da Cunha cienticifista, historicista e naturalista – de um lado – que rompeu com o imperialismo literário da época – de outro lado – e, em suma, deu início a uma análise científica sem precedentes em benefício dos aspectos mais importantes da sociedade brasileira. Nossos incondicionais aplausos...

Afonso Estebanez
Cônsul de Poetas del Mundo para Cantagalo/RJ

*RUTH FARAH NACIF LUTTERBACK (1932-2017), mais conhecida apenas como Ruth Farah, escritora, trovadora emérita, professora e incentivadora da cultura regional, nasceu no município de Cantagalo-RJ em 11 de abril de 1932. Seus três amores culturais: Cantagalo, Educação e Euclides da Cunha. Já participou do Colóquio Internacional “Caminhos da Memória” e recebeu convite da UNESCO pela sua opinião sobre a Paz Mundial expressa em versos. Seu nome muito festejado se encontra em várias Antologias Literárias, entre as quais a “Devemos Ver com os Olhos Livres”, com destaque para “Um Pingo de os Sertões”, ressaltando a memória literária legada por Euclides da Cunha, obra lançada em 2009, com apresentação de capa pelo poeta e escritor  cantagalense Afonso Estebanez Stael, Cônsul de Poetas del Mundo em Cantagalo. Ruth Farah foi Delegada da UBT (União Brasileira de Trovadores) em Cantagalo. Faleceu em 21 de fevereiro de 2017 e continua sendo celebrada em todos os movimentos culturais promovidos na cidade.


CANTAGALO PRESS POEM


Minha sombra cativa do cipreste
dos teus muros e ruas – rei deposto
na torre desse exílio – que me reste
ao menos a lembrança do teu rosto...

Se regressar por lei me for imposto
aqui estarei rendido em solo agreste
senhor do resto apenas recomposto
da glória que meu canto te reveste.

Se uma esperança acaso derradeira
reclamar em minh’alma forasteira
o regaço materno que me estreitas...

Tua paz calará os meus protestos
e para sempre deitará meus restos
nesse vale de luz em que te deitas!

Afonso Estebanez

(O autor foi incluído por decreto municipal
“Filho Ilustre de Cantagalo” entre várias
autoridades, escritores e artistas consagrados,
e representa sua cidade natal no Movimento
de “Poetas del Mundo”com representação
na Argentina, Bolívia, Brasil, Chile,
Equador, França, Suíça e Espanha).
SENSAÇÕES ANÍMICAS


Vem ver a noite dando à luz a lua
vem ver a aurora anêmica ao luar
vem ver o alvorecer que só recua
depois que expele o ímpeto solar.

Vem ver a praia rejeitando mortos
que a raça intolerante põe no mar
vem ver a saga dos desvios tortos
vem ter um pesadelo sem sonhar.

E ver a farda ser o pão das traças
caindo as máscaras dos generais
vem ver a babelização das raças,
vem ver um arrotar de vendavais.

Vem ver o mar beber a água suja
que já se vê dos fétidos mirantes,
vem ver os designers da garatuja
que imita o ícone dos almirantes.

O mar está bebendo o nosso Rio
que está com água suja de beber
vem ver esses calígulas sem brio
que nos tiram o brio sem morrer!

Afonso Estebanez