quinta-feira, 30 de outubro de 2008

POEMA DE PEDRA


POEMA DE PEDRA

Eu pedra bruta do tempo
que me passou esquecido
no inventário do momento
de viver de eu ter morrido
percorro o longo decurso
de todo o tempo perdido.

Eu profetas de gomorras
ruir de torres tombadas
sodomas de meus sentidos
de extintas almas salgadas
artesão de antigos sonhos
de mãos rudes algemadas.

Eu perdido se me encontro
sensível ao que não sente
descaminho de um futuro
de algum passado presente
vou pedra fingindo a carne
e sangue fingindo a gente.

Eu castelos de crepúsculos
naus sombrias sobre vagas
eu mortalha dos moluscos
de esperanças naufragadas
faz-se em mar a minha vida
das marés que são choradas.

Eu templo de deuses mortos
becos tortos sem calçadas
vendo o mundo das janelas
que o amor deixou fechadas
sou um elo entre essas vidas
que se atraem separadas.

Hoje sou pastor de rios
sentinela das colinas
mirante das fortalezas
nas ameias das neblinas...
É por mim que à noite
os ventos vêm chorar
sobre as ruínas.

A. Estebanez

MÃE... MÃE... MÃE...MÃE... MÃE... MÃE... MÃE...


MÃE... MÃE... MÃE...MÃE... MÃE... MÃE... MÃE...

MÃE – quintessência indecifrável para o enigma
MÃE – luz que nem a treva em transe obscurece
MÃE – quântico perfume íntimo sem paradigma
MÃE – istmo de amor que à noite me amanhece

MÃE – espelho sem face e quebrantado estigma
MÃE – sem medo do frio que o amor me aquece
MÃE – carta náutica da minha história fidedigna
MÃE – onde o desamor em lágrima desacontece

MÃE – esse doce ouvir quando o silêncio o fala
MÃE – esse doce me dizer quando falar me cala
MÃE – esse alfa et’ômega legado à humanidade

MÃE – ô, repórter de evangelhos não prescritos
MÃE – esse amor do exílio breve dos proscritos
MÃE – o amor breve o quanto dura a eternidade...

A. Estebanez

“BEIJÍSSIMOS”


“BEIJÍSSIMOS”

Por tudo o que me destes
por tudo o que não destes
a minha gratidão
em beijos de perdão...

Por tudo o que te dei
por tudo o que não dei
a tua gratidão
em beijos de perdão...

Beijíssimos
dulcíssimos
uníssonos
no coração...

A. Estebanez

O SENTIDO DA FLOR


O SENTIDO DA FLOR

... E neste milênio
o que for pequeno
vai multiplicar...
O que estava morto
ou que nasceu torto
vai ressuscitar...
Cada pensamento
é um testamento
do que vai ficar...
Nem uma aquarela
terá luz mais bela
que a rosa amarela
de intenso brilhar...

E a tulipa de ouro
secreto o tesouro
só pode encontrar
no verso do verso
do imenso universo
no anverso do mar...

É mais que uma flor
e mais do que amor
é o sentido de amar...

A. Estebanez

NÃO ACORDEM MINHA MORTE


NÃO ACORDEM MINHA MORTE

Não acordem minha morte
que descansa adormecida...
E que à alma não importe
se a morte é sono da vida.

Minha carne não acordem
e nem do sangue exaurido
o fluído que em desordem
deixa-me o corpo esvaído.

Dêem pó para minh’alma
que de mais nada precisa
senão do canto da calma
que de amor não agoniza.

Não acordem minha vida
que está só desacordada
e que a alma amortecida
só me acorde despertada.

E da morte não desperte
a minh’alma adormecida
e da vida ainda me reste
o outro lado desta vida...

A. Estebanez

CONFISSÃO DE PAI PARA FILHO


CONFISSÃO DE PAI PARA FILHO

Abro a janela para o amanhã
e não há nisso um vestígio de esperança.
Aceito a imposição de um novo dia
enquanto aguardo a hora do pão fresco.
Vivo intensamente o nada de em seguida
como um centauro ultrapassando o mito.
O que faço não marca o acontecimento,
senão o fechamento nulíparolunar
das portas dos dias das horas do tempo.
Sento-me à mesa e repito com a fome
o golpe traiçoeiro da abastança.
Abro o jornal e devoro uma notícia
que custou um sangue anônimo qualquer.
Eu não quero ser cúmplice do mundo.
Vou ao trabalho ou não vou,
ponho a gravata ou não ponho.
Afinal eu sou o que não muda o curso
de nada segundo a minha preferência.
Qualquer alternativa é uma imposição
do agora ilhado no tempo.
O passado foi e o futuro é na cozinha
onde a carne está sendo retalhada.
Enquanto isso, $uborno com produtos
importados a viciada alfândega do coração,
malgrado os impostos escorchantes
devidos à amável consciência...

A. Estebanez