quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

AMOR AO VINHO DE ROSAS


Esta noite
tu me permitirás ajardinar teu corpo
nos mais esconsos roseirais de amor 
em bosques sublimados no conforto 
de aviar espinhos sem ferir-te a flor...

Esta noite
procriarei em teus fecundos ninhos
de aves marinhas de plantão no céu...
Ah, rosa ausente dos cruéis espinhos!
Vinho de rosas com sabor de mel...

Esta noite
tomar-te-ei o amor que me suaviza
a alma sem nenhum ressentimento... 
Verei teu corpo com o olhar da brisa
e o tocarei só com as mãos do vento... 

Mas esta noite
quero-te o gozo múltiplo e esvaído
como as últimas lágrimas sem dor...
Só a dor de um calvário consumido
no inexorável instante desse amor!

Afonso Estebanez 
BARCAROLA

Era um reflexo de prata
de dançarina a bailar
na superfície das águas
das águas frias do mar...

Era uma nau desenhada
pelas mãos da preamar
na superfície das águas
das águas frias do mar...

Quanto mais a treva fria
encobria a luz do mar,
era luz feita das águas
impossível de apagar...

E nem a nave de guerra
que foi deixado passar
apagou a luz das águas
refletida sobre o mar...

Era luz, não se apagava
com as ressacas do mar,
já que era luz refletida
não deixava de brilhar...

Eram milhares de flores
de luz nas ondas do mar 
no jardim frio das águas
embriagadas de dançar...

Era a luz de minha vida
que a noite quis apagar...
Então deixei o meu sonho 
espalhado sobre o mar...

Afonso Estebanez
OFTALMOPOEM


O exame de fundo do meu olhar
responde ao resultado positivo
de cascatas de bruma sobre o mar:
cataratas de luz de um paraíso
como flautas de espumas do sorriso
numa canção tão simples de cantar...

Eu tomo teus olhos para enxergar
como cego que enxerga sem motivo
pelo simples prazer de navegar:
no mar imaginário do impossível
ainda que enxergar seja possível
como a última forma de te amar...

Afonso Estebanez
O INFERNO DO CÉU



Em parte somos feitos mais de sonhos
e em parte mais de morte e pesadelos...
Em parte entre conselhos de serpentes
que mentem como a face dos espelhos.

Flores não sangram sob seus espinhos.
Rosas nem sabem quando vão morrer...
Calam-se os ninhos quase indiferentes
se é para sempre quando amanhecer...

Amor é dom que não celebra a morte
é a flauta gêmea das canções da vida
que suaviza como o êxtase das almas
e acalma o coração que ainda agoniza...

Não há inferno onde um grão de amor
viceja em forma de uma flor qualquer...
Ah, luz do arco-íris dos portais do céu!
Oh, véu da flor de quando o amor vier!

Inferno é a dor que queima sem amor.
O amor é fogo que arde sem queimar.
Amor que amarga e dói e permanece.
Chama que a alma aquece sem tocar.

Malgrado tudo existe essa esperança
de que o sonho de luto dos enfermos
seja apenas lembrança desse inferno
que jaz eterno dentro de nós mesmos.

Afonso Estebanez